31/10/2012

Viver é preciso, futebol não é preciso

Qualquer um que acompanhe minimamente o futebol, está a par do polêmico jogo entre Internacional e Palmeiras, pela 33ª rodada. Por desencargo de consciência, explico o lance em poucas palavras. O jogo estava 2 a 1 para o Inter e, após cobrança de escanteio, Barcos (atacante do Palmeiras), marcou o gol de empate com a mão. O juiz não viu (ou fingiu que não), o bandeira não viu, ninguém viu. O gol foi marcado e o Palmeiras comemorava o empate quando, pouco depois, o juiz anulou o gol. Segundo a comissão de arbitragem, o quarto árbitro (aquele que levanta a placa das substituições) teria visto o toque e avisado a infração para o juiz central, via rádio.
Vamos às polêmicas: o juiz central estava a poucos metros e de frente para o lance, enquanto que pelo menos 50m separavam o quarto árbitro da jogada. O que provavelmente aconteceu (embora seja impossível de ser provado) foi a interferência de um delegado, presente próximo ao banco do Inter, que viu o replay pela televisão e avisou o árbitro. Tal ocorrência é proibida pela FIFA e acarretaria numa automática anulação do jogo. Além disso, ao tentar se esquivar das perguntas, o quarto árbitro disse que viu um braço vestido de uma manga verde subir para socar a bola, mas o Palmeiras jogava de branco.
A polêmica está instaurada. E, para muitos, ela declara a urgência pelo uso da tecnologia no futebol, como o recurso que foi utilizado pela comissão de arbitragem, ou como chips na bola e na linha de fundo.
Ao meu ver, a urgência é a inversa, é a do "retrocesso", da humanização do futebol.
Saiamos, por algumas linhas, da contemporaneidade do esporte, e viajemos para a copa de 1986, no jogo entre Argentina e Inglaterra. As seleções empatavam por 0 a 0 quando sai o famoso gol de Maradona. A Mão de Deus merece o codinome. O lance foi brilhante, o camisa 10 argentino desvia o cruzamento dando um soco na bola. Todos viram, menos o juiz. Gol validado, partida ganha e classificação encaminhada. O que aconteceria se houvesse uma câmera ou um chip naquele momento? O gol seria anulado e o jogo se encaminharia para mais uma irritante disputa nos pênaltis. O futebol teria perdido o jogo.
O que devemos nos perguntar não é o quanto estaríamos sendo precisos e justos ao usar essas medidas tecnológicas. O futebol não é justo, não é preciso. O futebol é brasileiro, é malandro, é Macunaíma, é Romário, é Garrincha. O que devemos nos perguntar é o quanto estaríamos perdendo ao burocratizar o imburocratizável.
A torcida não quer ver decisões corretas do juiz. A torcida quer xingar, gritar, urrar, guturar se necessário.
Por que o futebol é o esporte mais popular do mundo e não o basquete, ou o american football? Por que o futebol flui, tem poucas regras; basicamente, se o jogador não bater forte demais, ou se não colocar a mão na bola (desde que o juiz veja), o jogo segue sem parar. Enquanto que os esportes americanos são entediantes de tão fragmentados, com tempos, consultas aos televisores e correntinhas.
A globalização já dominou a nossa comida, as nossas casas, as nossas escolas. Não deixem que ela domine o nosso maior bem.

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