04/09/2011

escrita criativa

A escrita possui armas poderosas para se manter como um dos meios comunicativos mais utilizados na história. Ela se mantém intacta ao passar dos anos (diferentemente do acordo oral, no qual "quem conta um conto aumenta um ponto") e, por isso mesmo, exige um certo esforço do escritor para que ela represente um documento de qualidade, seja em relação a semântica, sintaxe, ortografia ou linguagem. Mas a arma que transforma a escrita, a meu ver, num meio tão importante, é o fato de que certas coisas só podem ser descritas através dela; coisas que, se ditas de outra forma, soariam estranhas, incompreensíveis, ou simplesmente ridículas. Imaginem só, se Freud decidisse subir num palanque para declamar seus pensamentos filosóficos ao invés de escrevê-los; ou se as propagandas de computadores começassem a exaltar os detalhes técnicos do disco rígido. Da mesma forma, há vezes em que um sentimento, se não for descrito no momento sentido (e mesmo assim, descrevê-lo torna-se um desafio e tanto), torna-se algo impossível de dizer e impossível de compreender e muitas vezes a escrita dispõe de meios muito mais eficazes para tratar de certos assuntos. Por exemplo, um jogo de futebol. Mas não qualquer jogo, aquele que abre o segundo turno, contra um rival tradicional e que mata a saudade do torcedor que não comparecia ao Pacaembu desde o começo do ano. Mas este exemplo ainda não é emblemático o suficiente. Já sei, um jogo de arbitragem confusa, de pênalti inventado, de golaço de falta, de duas expulsões e de pressão até o fim do time visitante, que precisava de um gol para empatar. Esse exemplo é bom.
O bom leitor (que entende de futebol, já que para mim, bom - e entenda este bom como o contrário de mau - é quem entende de futebol) já associou este exemplo à partida do Corinthians contra o Grêmio, da última quarta. Desde aquele jogo, venho tentando expressar o que senti depois da expulsão de Edenilson e da pressão gremista pelo terceiro gol, que empataria o jogo. Não consegui. Tentei dizer que me senti feliz por estar ao lado da torcida, que apoiou, a plenos pulmões, por 25 minutos; que me senti emocionado com a garra dos nove jogadores. Mas senti muito mais. Senti um vigor, como se eu tivesse a força de 15 mil pessoas. Senti amor, paixão em seu estado mais carnal. Senti afeto por todos aqueles de camisa alvinegra ao meu redor. Me senti Ulisses. Me senti Zeus.
Há alguns posts, comentei a força da torcida. Como uma massa tão heterogênea consegue produzir um som tão uníssono, tão poderoso. E realmente poderoso, pois afirmo (e desprezo aqueles que o negam) que a torcida foi sim um décimo segundo jogador, que energizou os jogadores, empurrando-os, jogando-os, atirando-os na direção da bola com uma vibração impressionante. Um bando de loucos que tem orgulho de expressar sua loucura.
Seria no mínimo estranho dizer algo assim numa roda de discussões futebolísticas, ou até mesmo numa conversa mais íntima. Ninguém se comunica, em público, dessa forma. Sendo assim, a escrita se apresenta como um ótimo meio de descrever algo da maneira que bem lhe convém.